"De vez em quando Deus me tira a poesia. Olho pedra, vejo pedra mesmo." (Adélia Prado)
Esfrego os olhos num movimento repetido, na pueril esperança
de voltar a ver mais do que se encontra ao alcance de minha visão. Quero de
volta o encanto que traz a poesia, com a capacidade transformadora da Beleza,
que me devolve criatura ao Criador. Versos de realidade que me firmam no hoje,
sem prender-me à dureza crua da desesperança.
Como viver sem poesia? Sem o encaixe das palavras certas que
fazem o mundo cantar? Devolve-me, Senhor, as entrelinhas falantes, os silêncios
eloquentes, as palavras que emudecem e os símbolos que traduzem os segredos da
alma! Devolve-me, Senhor, a vida que ultrapassa os sentidos e a transcendência das
esperas!
Se tens de tirar algo, por favor, não tires a poesia. Tira,
Senhor, por favor, a pedra, mas a pedra do sepulcro onde ficou sepultada a
sensibilidade do pintor, a escrita do poeta e a voz do músico. Tira a pedra do
medo que calou o artista. Resgata os que
precisam devolver ao mundo a poesia com sua arte. Faz rolar a pedra que
enterrou tantos talentos e tantos dons! Ressuscita aqueles que servem à Beleza.
Devolve-nos o Assombro de olhar pedra e não ver só
pedra. Ajuda-me a nunca mais sepultar a
poesia que me destes! Amém.
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